domingo, 14 de agosto de 2011

20 CORAÇÕES NA BALANÇA


por Ana Bárbara Ramos 

Pela crença egípcia, após morrer, o espírito da pessoa vai para a Sala das Duas Verdades, o local do ''julgamento final''. Ao chegar nessa sala, o deus dos mortos Anubis, que representa a mumificação, coloca o coração do morto numa balança cujo contrapeso é a pluma da Deusa Maat, que representa a justiça. Após Anubis ajustar a balança, verifica-se qual dos dois pesa mais: dependendo do resultado o espírito do morto pode ir para o ‘‘Paraíso’’ ou ‘‘Inferno”.

Pela crença da cooperativa paraibana FILMES A GRANEL, antes de morrer, o espírito da pessoa se alia com outros 19 e juntos fazem filmes de baixo orçamento. O objetivo não é chegar ao céu, mas se afastar do inferno, mais conhecido por aqui como a falta de uma política de fomento à produção cinematográfica local.

Apesar da produção de cinema existir na Paraíba há mais de 80 anos, os poderes públicos e privados nunca se interessam em cimentar uma política continuada de fomento ao cinema. São raríssimos os editais de produção e as empresas não custam a dar uma egípcia* quando se trata de apoiar as produções locais. Enquanto isso, nos estados vizinhos Pernambuco e Bahia os editais pipocam e aquecem a produção audiovisual que se propaga pelo país afora. A grama do vizinho nunca foi tão mais verde e brilhante.

Esse desanimador cenário despertou em meados do ano de 2010 o interesse de duas dezenas de realizadores independentes de João Pessoa e Campina Grande em formar uma cooperativa que viabilizasse suas próprias produções de curta-metragem. Assim nasceu a FILMES A GRANEL, um exemplo prático de como é possível produzir cultura e conhecimento usando criativamente a força de trabalho colaborativo de seus participantes.

De posse do velho esquema punk “do it yourself” (faça-você-mesmo) os realizadores se juntaram em torno do objetivo de fazer filmes com pouco dinheiro, em pouco tempo, com muita criatividade e invenção. Na balança da cooperativa confluíram diretores veteranos e estreantes, documentaristas, publicitários, quadrinista, atores, todos interessados na investigação de gêneros e na experimentação da linguagem audiovisual.

A estrutura da cooperativa é muito simples e funciona como um consórcio onde cada realizador é sorteado e tem o seu projeto realizado no período estimado de três meses. Com o desembolso pessoal de R$ 50,00 mensais, cada realizador/cooperado recebe R$ 1.000 para realizar o seu projeto. Com a parceria do SEBRAE local esse valor pode ser duplicado.

Um dos grandes desafios de quem faz filme pela cooperativa é a adequação de suas historias num esquema que se costuma chamar por aqui de rápido, barato e sob controle. Assim a maioria dos projetos apresenta características comuns de produção: equipes reduzidas, uma única locação, poucos atores e poucos dias de gravação. No frigir dos ovos, o que se pretende é a construção de uma narrativa onde o menos vale mais. Mas, ao contrario do que possa parecer, a opção por fazer filmes com um orçamento irrisório não é um mérito a ser seguido e muito menos enaltecido. Os participantes da FILMES A GRANEL sentem a necessidade de que seja implantada urgentemente uma política de fomento à produção de audiovisual no estado que esteja comprometida com as necessidades dos produtores paraibanos.

* virar a cara ao cruzar com pessoas indesejadas, com as quais não se quer  estabelecer um diálogo.

Resumo da ópera
Em pouco mais de um ano os filmes da cooperativa têm despertado interesse e começam a circular no país em diversos festivais, como o Cine Esquema Novo em Porto Alegre, na Mostra de Cinema de Ouro Preto, no Femina – Festival internacional de cinema feminino, no Rio de Janeiro e no Festival internacional de curtas-metragens de São Paulo.

Filmes prontos
A felicidade dos peixes, de Arthur Lins
Luzeiro volante, de Tavinho Teixeira.
O diário de Márcia, de Bertrand Lira
Oferenda, de Ana Bárbara Ramos

Em fase de lançamento
Escravos de Jó, de Daniel Araújo
Lavagem, de Shiko.

Em processo de finalização
O passeio na vida da matéria, de Bruno de Sales,
S.O.S samichunga planet, de Guga S. Rocha.
Walter Paparazzo, de Otto Cabral

Em fase de produção
O cassino é branco, meu bem, de Tadeu Melo.
Todas as fitas vermelhas, de Anacã Agra


2 comentários:

Ely Marques A.K.A elyfly disse...

"...Porque onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração."
Mateus 6 - 21

Vamos nessa e quem chegar por último é mulher do padre...
:P

Gian Orsini disse...

BIUTIFUL!